quinta-feira, 29 de maio de 2008

"Todos os homens são maricas quando estão com gripe" de António Lobo Antunes

Pachos na testa
Terço na mão
Uma botija
Chá de limão
Zaragotoas
Vinho com mel
3 aspirinas
Creme na pele

Dói-me a garganta
Chamo a mulher
Ai Lurdes, Lurdes
Que vou morrer
Mede-me a febre
Olha-me a goela
Cala os miúdos
Fecha a janela
Não quero canja
Nem a salada
Ai Lurdes, Lurdes
Não valo nada
Se tu sonhasses
Como me sinto
Já vejo a morte
Nunca te minto

Já vejo o inferno
Chamas diabos
Anjos estranhos
Cornos e rabos V
Vejo os demónios
Nas suas danças
Tigres sem litras
Bodes de tranças

Choros de coruja
Risos de grilo
Ai Lurdes, Lurdes
Que foi aquilo
Não é chuva
No meu postigo
Ai Lurdes, Lurdes
Fica comigo

Não é o vento
A cirandar
Nem são as vozes
Que vêm do mar
Não é o pingo
De uma torneira
Põe-me a santinha
À cabeceira


Compõe-me a colcha
Fala ao prior
Pousa o Jesus
No cobertor
Chama o doutor
Passa a chamada
Ai Lurdes, Lurdes
Nem dás por nada


Faz-me tisanas
E pão de ló
Não te levantes
Que fico só
Aqui sozinho
A apodrecer
Ai Lurdes, Lurdes
Que vou morrer

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